27 de julho de 2024

CRÔNICA – Baratas, formigas e moscas, pra que matar? (Francisco Nery Júnior)

Por

Redação, sitepa4

Por Francisco Nery Júnior

Podemos começar com duas histórias que não são minhas. A primeira, de uma daquelas pessoas que estão bem na nossa frente. Era um palestrante na televisão. A um certo ponto, chamou a nossa atenção para as formiguinhas no nosso banheiro, virtuais nossas amigas. Num mundo cada vez mais carente de amigos, elas as nossas amigas! E arrematou: “Pra que matar?”.

Entrei nessa: pra que matar? Embora empoderado pela mordomia concedida pelo Criador – mordomos somos da criação –, pra que matar? Não mato mais as formiguinhas do meu banheiro e até me esforço para salvá-las quando estão em dificuldade ou em perigo de vida. Me envergonho de mim mesmo quando, ainda na fase de brutamontes e insensível, as trucidava impiedosamente. Se o leitor notar como elas são bonitas, ordenadas, trabalhadeiras e parte da criação, o leitor terá dado um passo à frente.

Mexendo em uma caixa de esgotos, saiu uma barata. Levantei o chinelo e me preparei. Desensarilhei as armas. E parei. Parei com o chinelo no ar. E pensei no pobre inseto a lutar pela vida. Considerei que ao matar uma barata, apenas uma, não salvaria o mundo mesmo porque dizem os sábios que elas, as baratas, seriam as únicas a sobreviver a uma hecatombe nuclear universal desenfreada. A barata se safou e eu estou a contar a história.

Tempos antes, estávamos a ajeitar a calçada da frente da casa. Massa pronta e pedras arrumadas para serem assentadas. Havia um formigueiro assanhado bem no local de uma delas. O pedreiro, cioso do tempo e do custo da obra, simplesmente desconsiderou a presença das formigas e levantou a pá carregada de massa. Pedi um tempo e comecei a retirar o maior número que pude do local da massa. A pedra foi assentada.

Minutos depois, enquanto almoçávamos, uma mosca resolveu participar do nosso banquete sem o devido convite. Como soe acontecer, não contei conversa e massacrei a pobre mosca com um golpe fatal para a observação do pedreiro atento e questionador: “Oxente, professor, salvando as formigas e matando a mosca?”. O leitor pode imaginar como, desconcertado, mas satisfeito com o nível de raciocínio e abstração do jovem pedreiro, procurei me safar e justificar.

Resta considerar com os leitores desta coluna, leitores que leem para crescer e se libertar, quantas vezes “matamos” o entusiasmo, a iniciativa e a pureza de pessoas com quem convivemos. Quantas vezes abortamos a decolagem de quem quer voar ou para isto foi criado. Quantas vezes praticamos o bullying inútil, cruel e desprezível.

Podemos assim ter feito. Nos arrependemos agora e desejaríamos reverter o mal praticado. Nos contristamos e mesmo choramos o caldo derramado.

Como a competência do gerenciamento do tempo não nos foi outorgada, o jeito é a consideração e a prática de boas ações, aquelas que constroem, somam e acrescentam; quiçá nos redimem. Pra que matar?

 

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