
A notícia nos dá conta que um barco virou no reservatório de Petrolândia e um dos embarcados morreu afogado. Segundo o site, os oito passageiros estariam usando coletes salva-vidas. Ainda acrescenta que o corpo do rapaz de 29 anos foi retirado do fundo do rio. Das duas, uma: ou ele não usava o colete, ou o colete não tinha a qualidade necessária para evitar o afogamento.
Moro em uma região pródiga em lagos e reservatórios. Tenho o meu colete! Eu o coloco todas as vezes que entro em uma embarcação. Quatro episódios para o leitor:
- Levávamos três turistas americanos em passeio pelo canal PA-IV. Paramos em um restaurante à beira do canal. Lá estavam alguns conhecidos. Um deles me perguntou se eu estava com medo de morrer. “Exatamente isso. Não pretendo morrer afogado antes da hora marcada”, respondi;
- Entramos, a mulher e eu, em um daqueles barcos ridículos da travessia Mar Grande-Salvador; ridículo para a estatura de Salvador e da Ilha de Itaparica. Não vi coletes e questionei o “capitão” – que demonstrou irritação com a minha pergunta. Procurando não me atritar com ele – ele era o chefe! – simplesmente lhe disse que não navegaria naquela condição. Os coletes apareceram e chegamos sãos e salvos do outro lado. A título de ilustração, eu já tinha estado em um desses barcos, eu e uma turma de turistas, quando o motor falhou no meio da travessia e as ondas ameaçavam virar o barco até que o mecânico conseguiu religar o motor e, dessa vez, não afundamos. Não havia coletes a bordo;
- Agora, novo passeio de lancha pelo canal. Eu seria o tradutor de um grupo de americanos. Como gato escaldado tem medo de água fria, procurei o quanto pude, no depósito da casa, algumas braçadeiras, boias e nadadeiras do tempo da infância de Mário, meu filho. Ângela, a esposa, com um sorriso de negação, ou considerando ser a preocupação um exagero, tripudiou. Desconsiderei a sua reação e saí para o passeio carregando a minha bagagem [preciosa]. Pois na volta do lago de Moxotó, ao longo do bairro Centenário, uma ventania gerava ondas fortes que ameaçavam virar a lancha. Ângela, como era de se esperar, foi a primeira a se agarrar a uma das boias (eram cerca de quatro) que eu lançava para o pessoal.
Finalmente a ventania arrefeceu e todos nós, encharcados pelas águas benditas do São Francisco, desembarcamos vivos no primeiro porto seguro;
- Para mim, foi questão de honra cumprir o meu serviço militar. Escolhi a Marinha do Brasil. Durante um ano, saboreei a delícia de ser um marinheiro. Os militares nos ensinam muitas coisas importantes. Durante todo o ano, pressionei os meus superiores para termos aulas de natação. Um marinheiro tem que saber nadar! Apenas eu e mais dois colegas, dos setenta e cinco, tínhamos o segundo grau completo, o que nos garantia uma certa consideração – e alguns privilégios (nós três, inclusive, já conseguíamos nos comunicar em inglês que aprendemos nos colégios públicos de qualidade de então).
Os nossos bravos comandantes quebraram o pau no ouvido e seis conscritos do grupo se formaram reservistas da Marinha do Brasil sem saber nadar. Meses após a nossa formatura, li no jornal sobre o afogamento de um jovem numa pequena lagoa dos arredores de Salvador. Ele era Marinho, um dos seis colegas da minha turma que passaram pela Marinha e saíram sem saber nadar.
Se eu fosse legislador, brigaria ferozmente para a inclusão de aulas de natação nos currículos escolares. Injustificável alguém cair em qualquer poça d’água e morrer afogado por não saber nadar. Não se aprende a nadar. Treina-se. Também procuraria aprovar uma lei obrigando o uso de coletes salva-vidas em qualquer viagem fluvial ou marítima. Não apenas coletes “em locais visíveis e accessíveis”.
Em muitas ocasiões, gastam-se verdadeiras fortunas para a salvação de uma vida. Paradoxalmente, perdem-se vidas pelo simples desleixo da falta do uso de um simples colete salva-vidas.
Francisco Nery Júnior






Excelente texto, professor. Apoio sua causa. Parabéns.
No primeiro item, a pergunta foi feita porque eu usava um colete.